28/09/2008

Pregos e Pregadores

"Andava à toa na vida quando um livro me chamou" e chamou muito bem a atenção. era um livro de formação cívica destinado aos alunos do 3º ciclo. fiquei estarrecida. "Afinal, os miúdos andavam a ter formação para a vida política!"

Sentei-me e desfolhei o livro.


Ao fim de alguns minutos pensei que se calhar as coisas não eram bem assim.

O livro estava dividido em capítulos muito interessantes: educação ambiental, para a saúde, os direitos humanos, educação política, etc.
Os meus olhos brilhavam!
Contudo fiquei um tanto ou quanto desanimada ao ver que cada sub-tópico havia uma ficha de trabalho. nesta ficha estava um texto escassos conceitos sobre cada uma das temáticas abordadas.
Li outros textos.
Ou eu sou muito exigente, ou fiquei com um vago sabor a nada dentro da boca.
No único texto que havia sobre votos e eleições, as questões a ele relativas prendiam-se em coisas como fazer o levantamento do partido mais votado nas últimas eleições, na junta de freguesia, para a Assembleia da República, etc.
De todas as questões, a mais interessante fazia-se sobre o conteúdo de um artigo publicado no Jornal de Notícias. Era pedido para explicar a problemática da abstenção eleitoral.

Foi o suficiente para iniciar um exercício de retórica com os meus botões.


Vejamos, mais do que nunca é importante explicar aos miúdos que chamar "Baleia" a uma colega com excesso de peso, pode causar-lhe traumas para o resto da vida. Há que saber fazer reciclagem. Há que alertar que educação sexual não é ensinar o Kama Sutra mas sim os cuidados que devemos ter connosco e com os outros.

O livro tinha igualmente exercícios sobre o que eram os impostos e a importância da eleição do delegado de turma.

Mas, mas, mas...

(e estes mas repetiam-se em loop na minha cabeça).

Como serão leccionadas estas aulas?


Não quero chamar nenhum professor de incompetente ou coisa que o valha. Aliás, acho que é isso que se tem feito injustamente na nossa sociedade.

Os senhores que tinham formação para transmitir os seus conhecimentos especializados às massas ignorantes, são agora trabalhadores de uma grande de uma empresa chamada "ensino público".
Se estes trabalhadores não conseguirem uma boa taxa de lucro (leia-se pequena taxa de retenções), são chamados de incapazes e vão para a rua.

Um aluno pode ter um baixo QI ou um grande índice de preguiça mas, independentemente disto, um professor (a nova designação para esta profissão poderia ser "funcionário público de educação"), tem que apresentar resultados.
Isto, como se o acto de despertar interesse e fazer compreender conceitos abstratos fosse tão simples como programar uma máquina para fazer biscoitos.

Mas enfim, deixando os biscoitos pars os filosófos clássicos, voltemos à temática deste post e vejam se comprendam onde está o prego do meu pé.

O meu desconforto com a temática da formação cívica vem pelo facto de tanto ser o professor de matemática como o professor de educação visual a leccionar esta cadeira. Tanto pode ser alguém que sabe que participar na vida política é muito mais que votar, como alguém que gosta de estar no grupo da abstenção eleição sim, eleição também.


Estamos a falar do 3ºciclo.

Filosofia, psicologia e sociologia são disciplinas que só tem lugar no ensino secundário.

não há ninguém das ciências políticas ou das ciências sociais responsável por isto.

Comprendam, um professor de matemática até é capaz de compreender o funcionamento do sistema respiratório, até é capaz de dar uma boa aula de Biologia se se preparar um pouco mas, será a mesma coisa que alguém que estudou Biologia durante anos?!

Estes professores que eu admiro pela missão herculiana de fazerem formação e investigarem acerca de componentes que nada têm a ver com a sua área de estudos, têm que ser os pregadores da boa palavra que são os deveres cívicos.

São aqueles que têm que ensinar um conjunto de práticas políticas que eles não aplicam na própria vida.


São estes os pregadores que têm que passar por cima da educação paterna que as crianças trazem de casa e que grande parte das vezes incentiva à indiferença política. Será justo jogarmos a responsabilidade de formação política em cima dos professores?


E a televisão?
E a rádio?
E a internet?

Se a educação não vem de casa todas estas falhas são culpa da sociedade, são nossa culpa, que vê e fecha os olhos.

Agora pensem, qual vai ser a formação que vão ter os futuros eleitores e governantes do nosso país!!

Pensem como vai a atitude social e política destes filhos da abstenção!

Pensem no que vai ser a estrutura lógica e mental que vai na cabeça destes resultados da indústria do ensino.

Um conselho: pensem agora!! Mais tarde pode ser tarde demais.

Desta vez excedi-me e escrevi demais. Desculpem.

Até breve.


K

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